O Assunto – A Disputa de Força entre os Poderes
Data: 04/12/2025
Host: Vítor Boiadjan
Convidado: Cláudio Couto (cientista político e professor da FGV-SP)
Visão Geral do Episódio
Neste episódio, “O Assunto” examina as recentes tensões e embates entre os poderes Executivo, Legislativo e Judiciário no Brasil. O foco é a escalada de disputas institucionais nas indicações para o Supremo Tribunal Federal, a tramitação e aprovação de projetos de impacto fiscal e ambiental, e as retaliações políticas cruzadas — todos compondo um cenário de enfrentamento e instabilidade na República. O episódio aprofunda-se com a análise do cientista político Cláudio Couto, contextualizando o cenário à luz das eleições de 2026, da judicialização da política e do enfraquecimento dos mecanismos tradicionais de equilíbrio entre os poderes.
Principais Pontos e Discussões
1. A Decisão do STF e a “Blindagem” dos Ministros
- [05:30] Contexto: O episódio começa analisando a decisão do ministro Gilmar Mendes (STF) de permitir apenas à Procuradoria-Geral da República solicitar o impeachment de ministros do Supremo, e não qualquer cidadão, como era possível antes.
- [06:04] Cláudio Couto:
- Afirma que a decisão reduz o poder do Senado e concentra a decisão sobre impeachment de ministros dentro do sistema de justiça, tornando o processo “quase interno”.
- Aponta divergências na comparação com impeachment de presidente, pois ali qualquer cidadão pode solicitar, enquanto a nova interpretação restringe a legitimidade.
- “Não é uma decisão qualquer, é de uma gravidade imensa, porque restringe o início do processo de impeachment do Supremo a um agente de primeiro nível do sistema de justiça.” (06:04)
- [08:23] Tema da Blindagem:
- Vítor pergunta se seria algo similar à “PEC da blindagem”, que parlamentares discutem para dificultar seu próprio julgamento.
- Couto responde que a acusação de “blindagem” feita ao STF faz sentido diante da ameaça de instrumentalização do impeachment para fins políticos, principalmente pelo bolsonarismo.
- “A blindagem tem um sentido e peso diferentes do que é para deputados e senadores, pois o impacto de afastar um ministro do Supremo é muito maior.” (09:06)
- [10:38] Comentário sobre Golpe Parlamentar:
- Analistas veem a decisão do ministro Gilmar Mendes como uma tentativa de “desarmar de forma preventiva” um suposto golpe parlamentar tramado para 2027 (10:38).
- [11:02] Couto:
- “Talvez seja uma blindagem necessária para o funcionamento do Estado Democrático de Direito.”
2. Legislativo x Judiciário: Desobediência e Conflitos
- [11:08] Casos de Parlamentares Condenados:
- Vítor questiona se a não cassação de mandatos de deputados condenados pelo STF não representa uma afronta ao Judiciário.
- Cláudio Couto (12:11):
- Considera afronta sim, pois a Câmara argumenta, sem evidência, que decisões do STF teriam sido injustas ou sem provas.
- Utiliza o caso de Carla Zambelli (envolvida em invasão de sistemas e perseguição armada) para ilustrar ação corporativista no Legislativo.
- “O parecer favorável à não cassação da deputada vai nessa direção: que ela foi condenada sem provas. Isso é uma acusação gravíssima.”
- [14:30-15:34] Custos à República:
- Relatam que parlamentares condenados seguem recebendo salários e benefícios, totalizando mais de R$ 400 mil mensais, mesmo diante das determinações judiciais (14:30).
3. Senado x Planalto: Disputa por Indicações e Retaliações Políticas
- [15:44-16:30] O Caso Messias e a Sabatina no STF:
- Vítor explora a tensão causada pela indicação de Jorge Messias ao STF, contrariando a preferência do presidente do Senado, Davi Alcolumbre, que apoiava Rodrigo Pacheco.
- Cláudio Couto (16:30):
- Situa que negociações políticas em indicações não são novidade, mas adverte contra “retaliação” do Senado ao Planalto.
- “Usar o poder do Senado para, por insatisfação, aprovar pauta-bomba e destruir regulação ambiental é agir de forma predatória.”
- [19:59] Impactos e Retaliação:
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Projetos aprovados pelo Congresso em possível retaliação: aposentadoria especial para agentes de saúde (20 bilhões em 10 anos) e a derrubada de vetos ambientais, classificados por especialistas como “verdadeiras regressões”.
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Quote de Cláudio Couto (20:03):
- “Quando age assim, retaliando o país por não ter sido satisfeito na indicação ao STF, Alcolumbre age de modo que prejudica o Brasil.”
- Compara o impacto dessa disputa a outros episódios de sabotagem por interesse particular, citando um paralelo com Eduardo Bolsonaro e sanções sobre o Brasil.
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4. Pauta da Segurança Pública e o Fla-Flu Legislativo
- [23:19] Vítor relata como a tramitação do projeto de lei antifacção virou palco de disputa entre Executivo e Legislativo – com interesses eleitorais de 2026 já em movimento.
- Cláudio Couto (24:07):
- Vê risco de os projetos do governo não avançarem no Senado em meio ao clima hostil incentivado por Davi Alcolumbre.
- Comenta que até senadores moderados podem ter dificuldade de garantir tramitação equilibrada, pois o “jogo está aberto”.
5. Investigações, Emendas e o Empoderamento do Parlamento
- [27:41] Pano de Fundo dos Conflitos:
- Investigação sobre uso de emendas parlamentares e operações da PF envolvendo grandes figuras políticas alimentam o clima de suspeita, instabilidade e resistência agressiva ao Judiciário.
- “O Congresso hoje dá as cartas em grande medida e, dentro do Congresso, principalmente os presidentes das duas casas, Alcolumbre no Senado e Hugo Mota na Câmara. E esses dois presidentes estão às turras com o Executivo.” (Cláudio Couto)
- As investigações processadas por ministros do STF (Dino, Alexandre de Moraes) agravam a animosidade e a judicialização da política.
- Destacam-se mudanças institucionais recentes, sem tempo suficiente para acomodação, alimentando a “tensão triangular” entre Legislativo, Executivo e Judiciário.
6. Riscos para a República e a Democracia
- [31:33] Instabilidade e Incerteza:
- Cláudio Couto alerta para o impacto negativo da constante instabilidade e da falta de clareza sobre responsabilidades institucionais.
- “Isso prejudica porque gera muita incerteza... muitas vezes o que você tem aí é um enfrentamento de poderes em que, para assegurar o seu espaço, alguns poderes ultrapassam o limite do que seria razoável.”
- Ressalta que ameaças de impeachment do STF, decisões monocráticas abusivas ou uso do orçamento para pressões políticas fragilizam a democracia e o funcionamento saudável da República.
Notas e Momentos Memoráveis
- [06:04] – Cláudio Couto: “Não é uma decisão qualquer, é de uma gravidade imensa, porque restringe o início do processo de impeachment do Supremo a um agente de primeiro nível do sistema de justiça.”
- [09:06] – “A blindagem tem um sentido e peso diferentes do que é para deputados e senadores, pois o impacto de afastar um ministro do Supremo é muito maior.”
- [11:02] – “Talvez seja uma blindagem necessária para o funcionamento do Estado Democrático de Direito.”
- [20:03] – “Quando age assim, retaliando o país por não ter sido satisfeito na indicação ao STF, Alcolumbre age de modo que prejudica o Brasil.”
- [31:33] – “Isso prejudica porque gera muita incerteza... alguns poderes ultrapassam o limite do que seria razoável... é um problema direto. E, em segundo lugar, afeta a própria democracia.”
Timestamps de Segmentos-Chave
- [05:30] – Decisão do STF e início das tensões recentes
- [08:23] – Comparação com a “PEC da blindagem” e acusação de proteção
- [11:08] – Conflito Câmara x STF sobre cassação de parlamentares condenados
- [15:44] – Origens da disputa Senado x Planalto sobre o STF e suas consequências
- [23:19] – Projeto de lei antifacção e guerra de narrativas eleitorais
- [27:41] – O pano de fundo das investigações e emendas parlamentares
- [31:33] – Reflexão sobre instabilidade institucional e riscos à democracia
Conclusão
O episódio ilustra como conflitos políticos e institucionais alimentam clima de imprevisibilidade na República, com cada poder buscando ampliar ou proteger suas prerrogativas, frequentemente em detrimento da colaboração institucional e do interesse público. O diagnóstico de Cláudio Couto adverte para o risco de erosão democrática no Brasil diante do acirramento entre Legislativo, Executivo e Judiciário – acentuando a necessidade de maturação das mudanças institucionais e do respeito à separação de poderes.
